Sydney nunca
foi a filha preferida ou a que ganhou mais destaque na família, este papel era
de seu irmão mais velho, Peyton. Crescendo à sombra dele, ela sempre se sentiu
meio invisível, levando uma vida certinha, sem fugir às regras e sem fazer
qualquer coisa que seus pais pudessem recriminar, ela era a filha perfeita,
vivendo no mundo perfeito.
Até que tudo
muda, Peyton sempre se envolveu com problemas e até bebidas, e um dia, em um
acidente estando bêbado ao volante, ele atropela um garoto, que fica
paraplégico. Toda a vida da família muda neste instante e o rapaz vai preso.
Mesmo sendo o grande responsável por provocar aquilo, seus pais sempre o
consideraram como a vítima, principalmente a mãe, que fazia de tudo por ele,
para que se sentisse bem, já que não se conformava com o destino terrível do
filho.
A filha mais
nova, não aguentando mais viver sob os holofotes do que seu irmão fez e
querendo mudar um pouco sua vida, decide trocar de colégio. No começo as coisas
não são muito favoráveis, afinal é difícil começar do nada em um local novo
sozinha, mas tudo está prestes a mudar. Sydney um dia vai a uma pizzaria depois
das aulas para evitar voltar para casa e para sua realidade. E é lá que conhece
a extrovertida e simpática Layla, filha do dono do restaurante. A amizade entre
as duas começa e se fortalece rapidamente, fazendo com que nossa protagonista
se sinta confiante para lhe contar todos os seus segredos, aqueles que mais
ninguém jamais soube antes, pois nunca saíram de sua cabeça e se transformaram
em palavras faladas.
Layla logo
leva sua nova melhor amiga para conhecer sua família, que a aceitam como se
tivesse feito parte daquilo a sua vida inteira. É lá que ela vai se sentir
acolhida e amada, diferente de tudo o que vivenciou até então, onde começa a
entregar pizzas, uma atividade da qual percebe que gosta muito, e também onde
conhece o único que a enxergou verdadeiramente, Mac. Agora a garota passa a
notar que finalmente pôde tomar as rédeas de sua própria vida.
“Mas não foi
só a companhia de Mac que me fez gostar das entregas. [...] fiquei intrigada
com aquilo. Havia algo que me fascinava na ideia de ir na casa de gente
estranha, de espiar outros lugares e as pessoas que moravam ali. Talvez porque
sentia que minha família era observada o tempo todo por pessoas de fora. Era
legal poder estar do outro lado.”
Eu amo Sarah
Dessen, que já se tornou uma das minhas autoras preferidas da vida, todas as
suas obras que li me encantaram e me tocaram de alguma forma e com esta não foi
diferente. Inclusive ela é considerada uma das melhores escritoras de livros do
gênero jovem adulto existentes no mundo e, para mim, sua fama faz jus ao seu
talento.
A autora
sabe como apresentar problemas mais sérios de uma forma bem leve, e acho isso
fantástico, pois os leitores mais jovens podem se identificar e ainda encontrar
uma forma de sair da escuridão, sem ficar totalmente depressivos ou algo tão
ruim quanto. É como se ela estivesse aconselhando-os de uma maneira sutil,
fazendo com que não se sintam os únicos a terem problemas semelhantes.
Considero esta a melhor forma de conversar com os jovens, porque não choca, mas
mostra que todos temos problemas e podemos sair deles sem que nossos mundos
desabem completamente.
“– Sim, mas também é um lembrete. [...]
[...] – Agora continuo a usar para não esquecer o que perdi.
Era estranho
ouvir isso. Estava acostumada ao contrário: ausência como sinônimo de dor.”
Sydney é uma
protagonista carismática, que enfrenta várias situações de cabeça erguida,
apesar de não revelar a ninguém de fora o que realmente passa dentro de si. Mas
nós, como leitores, podemos conhecê-la a fundo devido a narrativa ser em
primeira pessoa, o que nos aproxima ainda mais dela e nos faz desejar que tenha
um final mais do que feliz, porque ela realmente merece depois de tudo que teve
que enfrentar ao longo do caminho.
Também
gostei bastante de conhecer sua nova melhor amiga, Layla, que a acolheu e a
apoiou de uma maneira incrível. Foi muito bonito ver a amizade das duas
nascendo e se fortalecendo, e gostei de como a mesma foi explorada. Todos os
personagens criados pela autora possuem suas personalidades bem definidas, com
qualidades e defeitos bem trabalhados, como um ser humano de verdade, e isso é
o mais bacana em suas histórias.
Eu gosto
muito de romances e considero que o deste livro acabou sendo deixado muito de
lado. Não estou dizendo que algum dos livros de Dessen foque mais o
relacionamento amoroso da protagonista (pelo menos isso não aconteceu em nenhum
dos cinco que li), mas acho que este ficou tão sutil que não consegui sentir muito
pelo casal, não deu tempo de torcer de verdade ou de me envolver com o que eles
estavam vivenciando, infelizmente. Para quem gosta de livros que tenha o
romance como segundo plano, esta é uma ótima opção.
Acima de
tudo o livro fala sobre relacionamentos e confiança e gostei muito de como
ambas as coisas foram trabalhadas e muito bem desenvolvidas. Há todo um
contraste com relação a família de Sydney e a de Layla. As duas têm bases
familiares bem diversificadas, de um lado uma mãe totalmente preocupada com um
filho, fazendo de tudo por ele mesmo quando o mesmo deseja distância e deixando
de lado a outra filha, como se ela fosse um nada, sem problemas, sem
preocupações e só com o objetivo de estudar e ser perfeita. Sobre o pai nem há
muito o que comentar, já que ele e nada são exatamente a mesma coisa, ele não
se impõe, não ajuda a filha, não levanta a voz, não presta atenção ao seu
redor, etc. Enquanto no outro lado, há uma família unida, divertida, que não
deixa os problemas suplantarem os bons momentos, onde os filhos são igualmente
tratados e também cuidam de sua mãe com muito amor e carinho, eles vivem em um
ambiente menor e com menos condições monetárias, mas muito mais acolhedor,
preocupado com o bem estar do próximo, incluindo gente de fora, como a própria
Sydney.
“Dá
para ver todas essas pessoas em lugares diferentes. São como pequenos retratos
em tempo real do mundo inteiro.”
Uma coisa
que me incomodou muito na Sydney é que ela era passiva demais. A menina ficava
chateada com algumas situações, queria se rebelar ou mostrar que era diferente
do irmão, que merecia mais confiança, etc., mas chegava na hora ideal e sempre
voltava atrás, deixava de se impor, aceitava tudo de cabeça baixa. Não teria me
irritado tanto se por acaso além de termos visto seu amadurecimento ao longo
das páginas, no final ela se rebelasse e dissesse o que realmente sentia e
pensava, mas nada disso aconteceu. O máximo de ação que teve neste sentido foi
quando o livro estava se aproximando do fim e ela agiu de uma maneira mais
interessante, mas só depois de algo terrível quase ter acontecido a ela e numa
situação de extrema importância e, mesmo assim, só foi uma ação bem fraca de
sua parte, que ainda teve uma justificativa sensata, e nada de grandes
revelações sobre tudo o que estava sentindo.
Até teve uma
cena, próxima a este acontecimento, que poderia ter sido desenvolvida mostrando
uma conversa entre mãe e filha, já que a gente, como leitores, acabamos
esperando que isso aconteça o livro inteiro. Mas Sarah optou por não escrever
este papo, somente citar que ele aconteceu, e isso me incomodou muito porque eu
queria ver a exploração desta liberdade e expressão de sentimentos e isso não
ocorreu de fato.
Eu senti
como se ela tivesse moldando a personagem e seu amadurecimento em todas aquelas
páginas e situações que vivenciou até então, bem devagar, bem detalhado, para
chegar na hora e simplesmente desistir de ir por este caminho de exploração da
cena porque a obra já estava longa demais e não daria tempo de expor tudo em
poucas palavras. Ou seja, vários ganchos foram sendo deixados pelo caminho, mas
na hora de juntar todos para serem transformados num desfecho arrebatador, ela
desistiu. E eu realmente queria que pelo menos tivesse uma tentativa.
“Pelo
que eu estava aprendendo, ninguém era cem por cento ruim. Mesmo a pior das
pessoas em algum momento teve alguém que a amasse.”
A escrita de
Sarah é muito, muito gostosa, e ela sabe nos inserir no mundo que criou de uma
maneira bem feita e envolvente. Além disso, a forma como ela consegue trazer
assuntos pertinentes e reais para as páginas faz com que tudo seja mais crível,
como se conhecêssemos os personagens de verdade, e eles fossem de carne e osso,
afinal. A gente conhece pessoas (mesmo que não tão próximas a nós) que passam
por problemas semelhantes aos abordados na obra, ainda que todos os detalhes
não sejam exatamente iguais, mas a forma como lidam com eles ou até os pontos
secundários, e não a trama principal. Por exemplo, não necessariamente você vai
conhecer alguém cujo irmão foi preso por algum crime, mas pode conhecer alguém
cujos pais o comparam com outra pessoa e não o deixam fazer nada por conta
desta comparação.
Este não foi
o meu exemplar preferido escrito por Sarah, esta posição ainda é de “A Caminho
do Verão”, mas eu gostei muito deste seu novo livro, que inclusive foi o último
escrito pela autora, publicado lá fora em 2015 também. Amo suas obras, que são
todas individuais, ou seja, sem continuações, apesar de ela gostar de fazer
brincadeirinhas, e alguns personagens ou lugares fazem pequeninas participações
em outros exemplares. E estou esperançosa de que, com o sucesso que esta está
fazendo no Brasil, outras de suas histórias também sejam publicadas aqui.
Dessen é
considerada a rainha dos YA contemporâneos e já escreveu doze romances mais
alguns contos que saíram em antologias com outros autores, mas apenas cinco de
seus livros foram publicados no Brasil (na ordem que foram escritos: "Aquele Verão", "Just Listen", "A Caminho do Verão" e "O que aconteceu com o Adeus?" – clique nos títulos para ler as resenhas),
então, como comentei acima, estou na torcida para que a Editora Seguinte
resolva trazer os demais sete títulos, não importa a ordem, e ainda uma edição
com seus três contos (sonhar nunca é demais, né?! Hahaha).
“Ninguém era capaz de saber o que viria
adiante; o futuro era a única coisa que jamais poderia ser destruída, porque
ainda não tivera a chance de existir.”
Não gostei
do final, chegando a sentir raiva do mesmo. Toda a trama gira em torno de uma
questão, ou seja, ela é a mais importante de todo o livro e é a responsável por
fazer todo o resto acontecer, direta ou indiretamente. Só que ela não é
resolvida. Eu poderia ter ficado satisfeita com o desfecho caso a autora
tivesse optado por outro tipo de resolução em relação a ela, mas, não. Dessen
decidiu colocar uma cena em andamento que tinha totalmente a ver com isso, nos
enchendo completamente de expectativas para chegar na hora exata e... finalizar
a história. Ou seja, deixou aquilo completamente em aberto. Esse tipo de final aberto para algo tão importante me
irrita profundamente e fiquei com vontade de tacar o livro na parede. Eu
realmente precisava saber o que ia acontecer depois daquela última frase, mas
agora nunca vou saber, o que é muito chato e também triste.
Adoro esta
capa, que representa uma parte bem importante da trama, e é extremamente mais
bonita do que a original. A edição impressa conta com acabamento soft touch
(aveludado), páginas amarelas e um marcador lindo preso na orelha de trás, que
o leitor pode recortar para guardar. A diagramação é simples e muito
confortável com uma fonte em tamanho grande e bons espaçamentos entre palavras
e linhas.
Para aqueles
leitores que curtem uma boa leitura do gênero jovem adulto que fala de assuntos
mais complicados e intensos de uma forma leve sem perder a essência, com
personagens carismáticos e muito bem desenvolvidos, uma pitada de romance e uma
trama comovente, Sarah Dessen é uma opção mais do que certeira. E este livro, “Os
Bons Segredos”, é uma graça e merece ser lido.
Avaliação