Quando a Selva Sussurra - Contos Amazônicos, organizado por Mário Bentes

Já comentei por aqui que o folclore brasileiro era na minha infância um dos temas que eu mais gostava de ler né? Acho interessante a simplicidade, a autenticidade e a verdade que esses contos passam sobre nosso país, logo ler sobre criaturas e lugares que inspiram contos é sempre relembrar o passado e alimentar o futuro. O livro Quando a Selva Sussurra - Contos Amazônicos, organizado por Mário Bentes, e publicado pela editora Lendari, trouxe muitas dessas sensações antigas a tona.

Essa antologia de contos tem como objetivo resgatar e reinventar estórias a partir da perspectiva e experiência de autores jovens da região amazonense. E isso de fato é bem marcante em todos os contos, é perceptível que os autores não só conhecem sobres as lendas, mas que vivem entre elas, não soam como alguém que pretendem falar de algo que estudaram, eles soam como alguém que cresceu entre estas lendas.

Estão presentes no livro 22 contos, todos eles com interessantes ilustrações que ajudam a imaginação na leitura de cada um deles. A narrativas são feitas em primeira e terceira pessoa, sob diversos pontos de vista, tanto de vítimas, como de testemunhas oculares. A diagramação está bem feita, assim como a capa que transmite o clima do livro.

Os contos são muito breves, assim não só pela grande quantidade, mas também para não estragar alguns deles escolhi comentar os que mais me chamaram atenção, seja pela boa qualidade como também por algum problema.

O conto que abre o livro é Mapinguari Urbano, e peca pela brevidade, trabalhar com a ideia de enfrentar a própria sombra ser mais assustador do que lidar com os monstros da noite é boa, mas precisava de mais algumas linhas de elaboração. Embora desperte reflexão alguns dados a mais fariam dele algo significativo.

Seguido temos A Árvores dos Cânticos, que tem uma semente para um livro, e diria que até uma série de livros, mas juntar o que renderia páginas e mais páginas em um conto foi ousado, e soou muito confuso! Existem muitos personagens que se embolam e prejudicam a ação e descrição da estória, especialmente para quem não está familiarizado com estes.
Já o conto Filha de Icamiabas é feito em primeira pessoa e tem todo aquele clima característico das lendas folclóricas com os pés na Amazônia. Ele explora um tema muito recorrente no passado, uma maldição em família, tema que até hoje ainda assombra algumas famílias.

Alguns contos trabalham a perspectiva de como essas criaturas lendárias atravessam as vidas cotidianas dos protagonistas e mudam suas vidas, como em Suindara Maldita e também em A Longa Noite de Antônio Felix e O Pescador Solitário. Sem muitas novidades contos como Filhos de Boto, A Cachoeira, Olhos de Icamiabas, Os dois Mundos apenas soaram como contos encontrados em livros infantis sobre o assunto.

Manaos Railway como os demais é curto, mas promove uma breve viagem no tempo quando o protagonista tem um encontro fantasmagórico, e ao seu final nos trás aquela sensação do conto bem executado.

O universo mitológico amazônico é muito vasto e profundo, alguns seres como Curupira e Iara são conhecidos por todos em todo Brasil acredito, mas alguns seres citados ao longo dos contos são desconhecidos por mim, e acredito que isso tenha atrapalhado a leitura. Quando leio uma versão sobre o Curupira, me sinto capaz de julgar se é ou não convincente, mas quando um conto fala pela primeira vez sobre um deus que nunca ouvi falar eu simplesmente não sei quem é, e nem se é uma boa reinvenção. Como o livro que não tem como objetivo apenas de ser vendido no Amazonas, um guia com referências a criaturas, termos, lugares e lendas seria muito útil na leitura dos contos e na aproximação das culturas. Assim como uma introdução mais ampla que amarre todos os contos também seria bem vinda, é verdade que existe sim uma pequena introdução, mas uma maior reflexão a cerca do que o livro pretende seria um convite para a leitura do que esta por vir.

Quando a Selva Sussurra evoca um universo muito comentado, mas pouco explorado pela literatura brasileira. Nos apresenta novos autores e nos convida a conhecer mais sobre esse lugar cheio de vida e cultura.



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