O que não existe Mais - Krishna Monteiro

São poucas as pessoas que podem se dar conta de quanto as ausências, as faltas e os vazios são mais presentes em nossas vidas do que as presenças, os preenchimentos e as pessoas. Nos marcamos mais com a morte do que com a vida, nos entristecemos mais com a separação do que com o convívio, afinal que tipo de seres somos nós que apenas nos alimentamos de falta e não de presença? O fato é que "o que não existe mais, quase sempre, é o que subsiste; aquilo cuja não existência se torna praticamente insuportável para quem vive do que existe...", essa frase vem do prefácio escrito por Noemi Jaffe do último livro que li, O que não existe Mais, do autor Krishna Monteiro, publicado pela editora Tordesilhas.

O livro é composto por sete contos onde a falta é o fio condutor. Monteiro tem uma narrativa que por diversas vezes beira o surrealismo, como em um sonho onde os fatos se ligam de forma caótica e carregada de significados que se escondem nos mais remotos cantos de nossa mente, e apenas fazem sentido quando nos debruçamos sobre eles. A poética é outra característica de sua escrita que não perde a oportunidade de refletir e aprofundar uma simples descrição.

O primeiro conto trabalha com o luto de um filho, ele se vê na casa onde seu pai morava e percebe que este está mais vivo do que nunca. O conto trabalha a percepção do lugar do pai na sua vida e do porque este morto na verdade encontrasse tão vivo quanto antes de sua morte. A narrativa é feita em segunda pessoa, característica rara, já que o filho conta para o próprio pai sobre a relação deles como em um jogo de esconde - esconde em sua casa.

O próximo conto feito em primeira pessoa talvez seja o mais viagem, e abre margem para mais de uma interpretação. É um homem que ouve o chamado de um médico e o segue por algumas desventuras. A pergunta que fica é: seria o protagonista um personagem dos escritos do médico? Ou na verdade trata-se de uma metáfora da cura que o médico empreende no paciente? O encadeamento de ideias é confuso, o que não permite um fácil reconhecimento da proposta da narrativa.

O terceiro conto é o mais entediante, embora até seja criativo pois trata-se de uma história feita em terceira pessoa sobre uma rinha de galos, sob a ótica do galo que ao mesmo tempo em que luta se lembra das memórias de sua vida anterior em sua casa. Embora no último conto este seja retomado, eu não compreendi muito bem o propósito do mesmo.

O que segue é original porque embora narrado em primeira pessoa, o narrador ao contrário do que costuma-se não é um humano, mas sim um cachorro, que só nos damos conta com o passar das palavras. Ele nos apresenta a sua dona, que parece estar doente e transcreve o momento de sua morte sob sua ótica, ou seja, de forma fragmentada e limitada, em pequenos pedaços.

O quinto conto nos transporta para uma pequena cidade do Rio Grande do Sul, onde o narrador nos apresenta as memórias de sua infância junto ao avô que o apresentou ao mundo, criando memórias que o marcariam e determinariam os rumos de sua vida adulta. Camada após camada, o avô se demora em suas experiências na segunda guerra. Ao mesmo tempo em que percebemos o papel da briga familiar da mãe e da avó que determina os rumos dessa relação. Este é o conto mais long, é divido em cinco partes.

Seguimos com o próximo em sua breves três páginas, onde o narrador aconselha alguém que está prestes a se suicidar a largar sua arma e viver a vida. O sétimo e último conto também trabalha com memórias de alguém que quando jovem ouvia histórias de uma senhora repleta de costumes e crenças. Esta senhora amarra dois contos anteriores, já que é ela quem fala do pai com o filho no Sul, e dos galos de sua casa. Isso foi uma estratégia inteligente e interessante, que nos faz pensar se ela não foi a responsável pelos demais contos também.

O que não existe mais é um livro de contos denso, escrito de forma mais intricada e não é acessível para quem não desenvolveu vocabulário ou sublimação. Nos proporciona muitos momentos de reflexão interna e confusão, mas vale sua leitura para quem quer ir além da zona comum e se sentir em um quadro de Salvador Dalí!


Avaliação







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Um comentário:

  1. Não é exatamente meu tipo de livro, mas gostei da ideia geral e me arriscaria em ler, essa falta é presente na vida de todos, em alguns mais, mas gostei de ver outras visões.

    Andy_Mon Petit Poison
    POISON BOOKS - A Rainha Exilada (Cinda Willams Chima) bit.ly/1NYiwBL

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