Eu não acredito em coincidências,
os fatos se conectam porque tudo faz parte de uma teia maior que se liga muito
antes de termos consciência. Eu digo isto porque A Guerra dos Mundos, do
britânico H.G. Wells, publicado pela Suma de Letras estava na minha lista de
leituras desde que sua edição capa dura saiu, mas eu não fazia ideia de quando
ia lê-lo menos ainda que se passava na Inglaterra. Eis que acabei de chegar de
Londres e minha leitura ao pisar aqui foi justamente esta!
Em uma noite de observações
noturnas do planeta marte um inglês e seu amigo observam estranhas explosões do
planeta, tudo parece interessante, mas o que eles vêem naquela noite só começa
fazer sentido quando o que parece ser um grande meteorito cai. Entretanto
quando ele começa a se mover eles percebem que trata-se de um objeto tripulado,
e que as criaturas que estão dentro deste cilindro não parecem amistosas com
seu raios que a tudo destroem. Outros cilindros caem, e começam a se mover
pelas cidades, e parece que nada que os humanos tem para se defender é capaz de
pará-los, será o fim da humanidade?
O livro foi publicado pela
primeira vez em 1898, e por ter mais de cem anos eu acreditava que encontraria
uma narrativa mais densa ou cansativa, nunca estive mais errada, porque Wells
narra em primeira pessoa (a partir deste
individuo inglês que acompanha tudo de perto) de forma muito atual, se eu não
soubesse a data em que foi escrito não diria que é tão velho tal a capacidade
do autor de soar atual. E mais do isso ele soa realista, narrando todos os
acontecimentos em detalhes, sem que com isso perca ritmo ou interesse. Mesmo em
partes que ele quer soar mais técnico ao explicar as máquinas dos
extraterrestres ele consegue captar a atenção do leitor, se referindo a quem lê
vez ou outra. Até a fisiologia dos mesmos ele se propõe a explorar!
Outro recurso interessante é que
quando ele quer falar sobre acontecimentos que fugiram a sua experiência ele
evoca relatos de outras pessoas, como é o caso de seu irmão que no momento dos
ataques se encontrava em Londres. Logo ele fala em primeira pessoa falando tudo
que posteriormente seu irmão lhe contou. Este recurso permite que uma visão
ampla do que aconteceu seja explorada.
Não sabemos o nome de nosso
protagonista, mas não por isso não temos uma profunda empatia com o personagem
que fala de si ao mesmo tempo em que descortina a invasão. Determinado a
sobreviver ao mesmo tempo em que seu espírito investigativo e curioso o impele
a seguir, o inglês passa por maus bocados fugindo destas máquinas impiedosas.
Sua capacidade de ser racional o salva da loucura por inúmeras vezes, ao mesmo
tempo em que desperta pensamentos filosóficos, já que a filosofia é sua matéria
de escrita.
Os personagens que ele esbarra
durante sua fuga exploram bem a natureza humana em momentos de tensão e extremo
perigo, mostrando como nestes momentos agimos como animais irracionais, sem
propósito. Um diálogo que ele tem na reta final do livro com um militar explora
esta questão do ser humano que segue o rebanho sem maiores propósitos de vida.
Esta conversa é excelente, pois nos alerta quanto a quem sobreviverá no final,
se os que seguem o curso, ou os fortes que querem mais da vida além de seguir o
protocolo.
De forma branda, mas explicita
Wells também critica a religião, já que um de seus companheiros de viagem é um
padre. Este padre se mostra tão distante da fé que propaga, e dos princípios
que deveria ter que coloca em cheque as ideias reproduzidas pela igreja. Claro
que estes questionamentos talvez não tenham grande impacto hoje, mas não
podemos esquecer que o livro tem mais de cem anos!
Como relatei no inicio acabei de
voltar de Londres, e esta leitura acabou sendo extremamente especial porque
Wells narra com detalhes muitos lugares de Londres, desde bairros, a ruas,
parques e museus, todos locais que eu estive. E é incrível imaginar que todos
eles são tão velhos, e ao mesmo tempo atuais. É uma sensação de viagem no tempo
que só esta experiência pode proporcionar!
Esta edição do livro está
caprichada, capa dura e com ilustrações originais de 1906, ela ainda conta com
um prefácio de Braulio Tavares, uma introdução de Brian Aldiss, membro da H.G.
Wells Society, além de uma entrevista de Orson Welles (responsável pela
transmissão de Guerra dos Mundos na rádio em 1938) com H.G. Wells. O que faz desta
edição uma excelente opção para a estante, já que todos estes complementos nos
permitem saber quem era o autor em maiores detalhes.
Não acreditava que gostaria
tanto, mas a leitura de A Guerra dos Mundos foi muito rica, pois nos narra
muito além de um confronto entre humanos e aliens. É uma estória que visa
explorar a natureza humana, e nosso lugar na Terra. Leitura obrigatória para
quem gosta de um bom livro, ou busca um clássico da ficção científica.
"Talvez eu seja um homem de
temperamento raro. Não sei até que ponto minha experiência é comum. Às vezes
sinto-me extramente desligado de mim e do mundo ao meu redor; parece que
assisto a tudo de fora, de um lugar incrivelmente remoto, fora do tempo, fora
do espaço, fora da tensão e da tragédia que nos cercam. Essa sensação me veio
com muita força naquela noite. Era outro lado do meu sonho" (pg. 92/93)
Avaliação
Olá! Sou super curiosa em ler esse livro, assisti o filme e gostei muito, essa resenha me deixou ainda mais curiosa em conferi essa história.
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