Esse ano não tenho dado muita
sorte com as leituras, as nacionais em especial têm me decepcionado mais do que
de costume! São poucos os livros que trabalham com a mitologia celta, sempre
que os vejo quero lê-los, mas nem sempre a atmosfera deste povo consegue ser
captada pelo autor, este foi o caso de Dois Mundos (Tesouro da Tribo de Dana
volume 1), da autora Simone O. Marques, publicado pela Editora Butterfly.
Em um futuro breve o Brasil sofre
diversas ondas de destruição, o que os sobreviventes não sabem é que toda morte
teve como fonte uma jovem que é protegida em uma fazenda. Ela é a escolhida
pelas deusas, dentro dela estão grandes poderes que ainda não sabe possuir,
menos ainda controlar. Uma tarde em mais um dia de tristeza da jovem ela rompe
o véu entre os mundos e se vê junto a seus guardiões em um lugar desconhecido.
Agora este trio deve voltar para casa, ao mesmo tempo em que precisa proteger o
que resta de seu mundo.
Até o fim da leitura do livro eu
me fiz a seguinte pergunta: Por que dizer que o livro é uma distopia? Porque
vendê-lo assim quando pouco, ou quase nada dele se passa no mundo destruído de
fato, e mesmo quando alguns poucos capítulos o são o foco não se dá no local
destruído ou na sobrevivência, mas na mitologia em si? O pano de fundo poderia
ter sido qualquer um que não faria diferença, alias arrisco dizer que se fosse
no nosso mundo moderno normal seria até mais interessante, e soaria como uma
fantasia urbana de fato. Talvez isso venha ser relevante em um próximo volume,
mas neste só fez bagunça no enredo.
Lembrando que as principais
características da distopia nem sequer foram utilizadas, não temos um conteúdo
moral trabalhado, já que não foi uma ação do homem que levou ao seu colapso,
mas o desejo de uma deusa; não temos crítica social, já que os personagens
parecem imersos em uma bruma de raciocínio; a estupidez coletiva não surge
porque quase não existem pessoas comuns na trama; o pessimismo não dá as caras
e embora poucos tenham sobrevivido não existe a violência ou a luta pela
sobrevivência que é marcante em obras do gênero, o pouco que existe são as
cenas de Pedro na antiga São Paulo. Logo embora sua sinopse diga que é uma distopia
ela não é de fato! É uma fantasia urbana em um local que foi destruído.
Outra ponta que na minha opinião
foi mau trabalhada foi a própria mitologia. Quando apresentamos ao leitor
deuses é o dever do autor de alguma forma o apresentar, ainda mais quando é
alguma mitologia mais desconhecida, como é a celta. Assim até o fim da trama
pouco é dito sobre Dana, a deusa que usa Marina como cálice. Quem é essa deusa?
Como são suas características? Um capítulo no inicio do livro relatando sua
estória, ou até suas intenções ao encarnar em Marina seriam muito uteis e
trariam sentido a trama. (Para os que tem curiosidade: Dana, ou , Danu é a mãe
dos Tuatha Dé Danann -conhecido como Povo das Fadas, é um dos aspectos da deusa
tríplice para os Irlandeses. Seus atributos são ligados ao de uma mãe, como
carinho e amor, ao mesmo tempo em que pode ser dura ao ensinar seus filhos.
Nada disso é dito no livro, e nem estas características aparecem na deusa
quando ela surge).
Marina é a jovem de quem tudo
esperam, mas que está longe, bem longe de estar preparada para ser o que deve
ser. Em outras palavras é uma mocinha mimada que é chata do começo ao fim. Quer
ser a mulher forte, mas nem se quer sabe o que é isso, já que cresceu protegida
do perigo e da vida como ela realmente é. É uma personagem fraca, sem
profundidade, que passa mais tempo lamentando sua sina, ou reclamando de seus
sombras que não são ou fazem o que ela quer!
Arthur, é um de seus guardiões,
juntamente com Brian, são eles que se perdem com Marina. E ao invés de vermos
guerreiros, o que acompanhamos são dois jovens que quando colocados a prova
entram em conflito consigo mesmos o tempo todo! Eles parecem saber lutar, mas
quanto ao trato humano são péssimos, a ponto de ficarem como papagaios
repetindo a mesma fala o livro todo sobre terem que proteger Marina a qualquer
custo, não a toa a mocinha fica chateada em todos os capítulos. Os hormônios
deste trio estão em alta, e eles sequer sabem o que fazer com eles quando tanta
coisa está em jogo!
Paralelamente a narrativa da
estória de Marina temos Pedro que é o oráculo, ele está no que sobrou de São
Paulo, e está voltando para Marina pois tem uma missão com ela. Bem lamento
dizer que não sei qual foi o destino do moço que terminou totalmente vago. Ele
é um jovem bonzinho, com boas intenções, mas um pouco ingênuo. E o ser que
surge em São Paulo com seus cachorros até o fim não sabemos quem era!
Quando estórias, personagens e
locais da mitologia celta são evocados a impressão é que a autora buscou
pesquisar sobre os mesmos, mas não submergiu no que é de fato a cultura celta,
o local de seus deuses ou os costumes deste povo de forma mais subjetiva. Digo
isso com conhecimento de causa já que os celtas são um povo que eu como pagã
gosto muito e estudo sempre que posso. Por terem tradição oral nem sempre é
fácil e confiável encontrar boas fontes, mas existem livros brasileiros bons
neste quesito.
O desfecho do livro terminou na
ação, mas não como um gancho para continuar, mas como algo que pareceu não
saber bem para onde caminhar. Infelizmente embora trabalhe com temas, seres e
mitologia que eu amo o livro não funcionou para mim, e pouco despertou minha
atenção, talvez seguindo outros caminhos...
Avaliação
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