Cerberus #02 - O Diabo Pede Carona - Leonardo Monte

Acho que uma das coisas que me fascina ao ler e ouvir as pessoas é ver a mudança acontecendo nelas, seja amadurecimento psicológico, seja como no caso no processo de escrita. Claro que não faço parte do processo, mas lê-lo dá a sensação de que de alguma forma estava lá quando aconteceu. No segundo volume de Cerberus- O Diabo pede Carona, do autor Leonardo Monte, da editora Literata esse crescimento é visível.

Voltamos as entranhas de Cerberus, a escola com quem resistiu a uma grande mudança na Terra e visa treinar seus alunos contra os extraplanares (criaturas que vieram de outras dimensões e destruíram a Terra). O diretor da escola, Izidro desapareceu em uma missão, e  padre Francisco assumiu o comando. Tirano, ele transforma a escola em um lugar horrível para se viver, a ponto do bando de Renan preferir arriscar suas vidas fora dos muros da escola, do que permanecer.

Sem ideia do que os aguarda, Renan e seus amigos buscam pelo antigo diretor, ao mesmo tempo em que tentam conquistar sua liberdade. Falhar não é uma opção, não alcançar seu objetivo significa derramamento de sangue e sofrimento, já que a volta de mãos abanando significa forca! Será que os Águias sem Medo conseguem vencer o que os aguarda do lado de fora?

Como comentei na introdução podemos ver o amadurecimento na escrita de Monte, sua narrativa se tornou mais complexa do ponto de vista estrutural. Não é uma história escrita de forma linear, ou seja, temos como centro a missão do bando, mas pequenas histórias começam paralelamente (acompanhamos Nancy e Pedrão em seus dramas), e com o andar da trama elas confluem em um mesmo rio.

Alguns temas diferentes são questionados no livro, o primeiro e mais importante é sobre as verdades que compramos como nossas a partir de pessoas mais velhas e ditas experientes. Muitas vezes essas ideias são vendidas de acordo com opiniões pessoais ou interesses, e não nos damos conta. O bando percebe isso quando tem maior contato com um extraplanar que os faz questionar o que acreditam.

A confiança também é um ponto trabalhado. Confiar não é e não pode ser um ato pautado no sentimento ou necessidade, mas na crença de que diante dos defeitos que você conhece no outro você acha que este é capaz de superá-las e ser digno de sua confiança. Quantas são as pessoas que você entregaria sua vida? Existe alguém com essa credibilidade? O bando acreditava que sim, mas Baltazar em seus breves discursos os fez crer que não!

A mitologia já presente no livro anterior foi mais trabalhada, e colocada diante da moral cristã. O dualismo que o cristianismo prega de criaturas boas ou ruins é marcante, mas questionado também, afinal não somos apenas bons ou maus, somos um dualismo constante onde um dos lados sobrepõe o outro, mas nunca é único. Uma nova classe de demônios aparece: os gabordes.

Cenas fortes são frequentes e bem exploradas. Confesso que meu estômago se revirou um pouquinho em determinadas cenas! Em especial uma que envolve uma prova de vida ou morte com o personagem Renan. Toda a ação é focada na sobrevivência, não apenas na sobrevivência pessoal, mas do grupo.

A fé também é colocada no palco, é fácil acreditar em Deus dentro do conforto de seu quarto, mas quando você se vê em meio a demônios e segundos que separam sua vida da morte essa palavra ganha dimensões diferentes, e isso é crível nas palavras de Leonardo.
Os fantasmas de cada membro do bando estão presentes, além das criaturas que os cercam são seus medos e o passado o que mais devem enfrentar. Não há um protagonista, todos aparecem de forma quase igual e com mesmo destaque, o que promove a sensação de unidade do grupo.

A única falha que encontrei foi o desfecho que se deu de forma muito rápida. Gostaria de compreender mais a respeito do vilão, entendi seu passado, mas não como é que ele terminou como estava no fim. Cheguei a pensar que ele nem sequer era humano, e senti falta de um pouco mais de dados a respeito, e sobre seus atos.

Os erros de revisão frequentes no volume anterior quase não apareceram nesse volume. Ainda acho que as capas deveriam ter uma qualidade melhor, o livro pede por isso. O autor já disse que está escrevendo o próximo volume e aguardo curiosa para saber o que ele pretende explorar nesse universo.

Mais uma vez Leonardo nos brinda com uma obra de qualidade, que permite uma fobia do escuro e uma vontade de ter uma espada em mãos, mas mais que isso em meio a sangue, violência e vida podemos questionar nossa posição diante da vida, e conviver melhor com aquilo que nos assombra.

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