Lily Bart é
uma moça linda, sofisticada, educada e inteligente que foi criada para sempre
querer e ser o melhor na sociedade conservadora de Nova York no início do
século XX. Quando a família sofre uma falência financeira e ela fica órfã de
pai e mãe, sofre sozinha as consequências de como foi criada e do meio em que
vive. Indo morar de favor com uma tia e sempre visitando amigos para se manter
ativa e também porque precisa, ela sente na pele o que é viver sob padrões morais
rígidos e sempre tenta se adaptar ao ambiente, porque é isso o que esperam dela
e a mesma não tem forças para lutar pelo que realmente deseja.
Para se
manter bem vista e continuar sendo convidada para frequentar os melhores
círculos, Lily gasta mais do que pode, contrai diversas dívidas e tenta fingir
que está tudo bem em sua vida, mesmo quando tudo ao seu redor está ruindo. Sua única
saída para as enfrentar as dificuldades e manter sua vida de luxo é encontrar
um bom casamento com um marido rico e bem visto. Mas as pessoas já começam a
comentar que ela está passando da idade. Lily tem algumas opções e sabe como
jogar as cartas certas para encontrar alguém que pode ser perfeito para o que
almeja. Porém, uma parte de seu interior sabota seus planos, porque ela sente
que pode mais do que isso, quer vivenciar um amor e também deseja poder ser
independente.
Lendo a
sinopse, imaginei que a obra me daria a oportunidade de ver uma mulher um pouco
fútil e que tenta se adaptar a uma sociedade da qual não quer realmente fazer
parte, mas acaba conseguindo fugir dos padrões e do esperado e encontra a
felicidade e o amor. Parte disso está certa, mas acho que podemos focar na
palavra tenta. Lily sempre foi criada
para vivenciar o luxo e acaba gostando, ou melhor, sentindo que precisa gostar
dele. Então faz de tudo para se manter ativa entre as pessoas mais admiradas e
no círculo mais exclusivo da sociedade. Mesmo refletindo sobre a vida, o
ambiente e o mundo, construindo inclusive pensamentos filosóficos, e
descobrindo um pouco mais sobre si mesma e o que deseja no âmago do seu ser, sua
honra, capricho, orgulho e até mesmo medo, acabam impedindo que ela seja a Lily
Bart que quer ser. Queria mesmo era vê-la evoluindo, conseguindo o que almejava
e encontrando o caminho da paz e felicidade.
Já
comentaram comigo que acharam a escrita da autora lenta e um pouco difícil, mas
achei bem tranquila. Normalmente, eu já demoro um pouco mais lendo obras
clássicas porque gosto de apreciar bastante a leitura e prestar atenção nos
detalhes, e o fato de a narrativa ser um pouco indireta também deixa a leitura
mais devagar, mas não de um jeito ruim ou incômodo. Porém, dessa vez eu acabei
terminando o livro até mais rápido do que geralmente acontece. Talvez isso
tenha acontecido porque agora estou mais acostumada com o estilo dos clássicos
do que há alguns anos, e também porque a tradução da Pedrazul funcionou muito
bem.
Nós
mergulhamos na alta sociedade Nova Iorquina do século XX, ainda antes da
Primeira Guerra Mundial, e acabamos conhecendo personagens que tinham o nariz
em pé e viviam de aparências e futilidades, numa grande rede de fofocas,
intrigas e hipocrisias, levando pessoas mais fracas a julgarem as outras por
coisas frívolas e fazerem outras desejarem vidas quase impossíveis.
Além de ver
esse lado, também vemos como as mulheres ainda eram tratadas na época, o fato
de que nunca eram vistas como iguais, não podiam ser o que gostariam e nem
fazer muitas coisas, pois as consequências podiam ser terríveis, principalmente
nos âmbitos social, psicológico, educacional e monetário. A parte triste disso
é que vários desses aspectos continuam funcionando da mesma maneira hoje em
dia, ainda que de um jeito um pouco mais sutil, porque tecnicamente as mulheres
já têm direitos, mas muitas pessoas ainda tratam determinadas coisas como
condenáveis, mesmo que para os homens nunca tenham sido.
Lawrence Selden é um personagem de extrema importância em sua vida e com quem ela tem as mais valiosas conversas. Ele é alguém com quem ela pode ser ela mesma, ainda que por pouco tempo, e com quem questiona muitas das coisas que vive ou gostaria de viver e como a sociedade de maneira geral age. Porém, Lily não pode ficar com ele, porque o mesmo não representa aquilo o que ela almeja: um homem rico e importante. Gostava muito dos diálogos e discursos dos dois juntos, que fazem o leitor refletir a respeito de diversos assuntos e aspectos.
Fiquei
realmente bem triste e indignada com o final. Depois de tudo que Lily Bart
viveu, ela merecia ter algo melhor – e quase teve, o que foi ainda pior. Sei
que seu destino é algo realista que pode, sim, acontecer. Porém, já acho que a
vida real é bem difícil e o mundo está repleto de situações ruins e
angustiantes, então particularmente gosto de ler obras em que os personagens
conseguem dar a volta por cima e encontrar um final feliz. Me dá esperança, me
transporta para um lugar bonito e me faz acreditar que há, sim, coisas belas no
mundo. Mas a autora me destruiu com o destino que escolheu para a personagem,
de verdade. Quem gosta de finais dramáticos, lamentáveis e dolorosos, que te
fazem chorar e perder um pouco de esperança, esse livro é para você. Se busca
algo diferente, recomendo outra leitura. Há uma crítica social no texto da
autora, mas ao meu ponto de vista também traz uma mensagem de desolação e uma
falta de esperança.
Aos leitores
que buscam conhecer obras clássicas que nos ajudam a entender um pouco mais
outra época e uma sociedade diferente da nossa, ainda que bastante parecida sob
alguns aspectos, esse romance de costumes é uma ótima opção de leitura.
“Ah, tem uma
diferença… uma garota é obrigada a se casar, já um homem pode escolher – e o
encarou com um olhar crítico. – Se o seu paletó estiver um pouco velhinho, quem
se importará? Isto não impedirá as pessoas de convidá-lo para jantar. Já se eu
andasse malvestida ninguém iria me convidar para nada: uma mulher é convidada
mais pelas suas roupas do que por ela mesma. As roupas são o cenário, a
moldura, se assim preferir. Elas não garantem o sucesso, mas fazem parte. Quem
quer ver uma mulher maltrapilha? É esperado que sejamos bonitas e bem-vestidas
até o fim, e se não conseguimos manter tudo isso sozinha, precisamos sair em
busca de um parceiro.”
Avaliação
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