A Depressão
com certeza é a doença do século, e com certeza você conhece alguém que tenha
ou que teve algum período no mínimo depressivo. A faculdade me permitiu ter
contato com esse modo de existência, mas fazia tempo que não lia a respeito.
Com tantas pessoas ao meu redor com humores suspeitos eu resolvi que precisava
ler mais, e O Demônio da Meia Noite- Uma Anatomia da Depressão, do autor Andrew
Solomon, publicado pela Companhia das Letras, foi meu companheiro por diversos
dias, e através dessa obra pude acompanhar um pouco dessas nuvens trevosas.
Solomon a
partir de sua própria batalha contra a depressão traça um quadro da doença que
assola o mundo inteiro, sem escolher raça ou nível social, idade ou sexo, todos
estão propensos, mas poucos assumem essa luta diária que requer coragem e muita
resistência.
Com os
objetivos em mente de despertar a empatia, e depois criar uma ordem baseada no
empirismo, ele parte de sua própria história, desde como era sua vida na
juventude até como de repente sua depressão surgiu. Passando por suas inúmeras
lutas para encontrar o remédio adequado, seus colapsos que geraram três grandes
crises e que o paralisaram por longos períodos, culminando no seu momento atual
de controle, mas não de cura.
Após relatar
sua jornada, ele busca capítulo a capítulo por temas relacionados, como os
tratamentos que são os antidepressivos ou algumas terapias de choque, sessões
cognitivo-comportamentais ou psicodinâmicas, e até alguns remédios
alternativos. Solomon faz uma análise muito interessante da população
acometida, e conclui que as mulheres parecem mais vulneráveis a se deprimir,
especialmente após o parto, e que filhos de mães deprimidas têm tendência a ter
depressões mais severas. Afim de levantar possíveis grupos de risco alguns
estudos segmentados são comentados por ele.
Um capítulo
é dedicado ao suicídio, e alguns aspectos interessantes são levantados. Como,
por exemplo, a alimentação que é tida como saudável para o corpo - baixo
colesterol e carboidratos- é geradora de depressão, já que diminui os
neurotransmissores. Como o cérebro é um enigma algumas atitudes tomadas afim de
arrumar a saúde podem colaborar para que o mesmo entre em desequilíbrio, um
corpo saudável sem uma mente saudável também não consegue funcionar, ele
facilmente entra em curto.
A pobreza
também ganha sua atenção, já que trata-se de uma camada da população com maior
dificuldade de diagnóstico. Isso porque essas pessoas que vivem sempre em
dificuldade já têm comportamentos retraídos e resignados que são associados a
sua condição de vida, e não a depressão. Eles também têm mais dificuldade de
conseguir e manter o tratamento, visto que têm jornadas de trabalho e serviços
domésticos que demandam mais tempo.
Alguns
aspectos políticos são abordados, mas são focados na política americana da
época em que livro foi elaborado. Não creio que tenha mudado muito, já que os
Estados Unidos são conhecidos por problemas com a saúde, apenas alguns estados
contam com saúde gratuita, e mesmo a população que conta com planos de saúde
não tem acesso ao tratamento de forma completa, muitas vezes com limitação de
consultas ou remédios. Batalhar para conseguir tratamento não é algo que um
deprimido seja capaz de fazer como um doente de outra doença, a força ação
dessas pessoas é quase nula.
Embora de
importância inquestionável com a onda de medicações houve uma grande
desvalorização das terapias, que foram deixadas de lado pelos remédios. E após
isso até mesmo os remédios têm ganhado adeptos da antimedicação, listando
argumentos contra o uso contínuo de antidepressivos. A verdade é que ainda não
existe uma cura, uma vez que você tenha essa condição você precisa de constante
controle e alerta, por isso tanto as terapias quanto os remédios precisam
caminhar juntos a outras atividades que despertem a vida no paciente. É provado
que falta de neurotransmissores nestas pessoas, mas corrigi-los também não tem
sido o suficiente para sanar o problema. Isso gera a pergunta o comportamento
depressivo gera essas alterações cerebrais, ou as alterações geram o
comportamento? Eu sou do time que pensa que nossos atos e pensamentos somatizam
no corpo.
Na reta
final um capítulo narra o que alguns dos entrevistados encontram de bom na
doença, como eram antes e ficaram depois. Como pessoas conseguiram melhorar e
seguirem ativas. Esta edição lançada em 2014 conta com um epílogo que o autor
acrescentou nesse ano de edição que trabalha alguns dos avanços de tratamento
desde 2001. Devo dizer que não foram tantos, parece que toda a pesquisa sobre o
assunto é financiada por grandes indústrias farmacêuticas, e creio que isso
limite o teto tanto financeiro quanto de interesse. Enquanto pesquisas contra o
câncer tem amplo interesse e dedicação, a depressão ainda não tem o espaço que
deveria, irônico já que a depressão facilmente pode gerar um câncer.
O único
aspecto que não me agradou foi a ordem que ele escolheu para abordar cada tema,
um capítulo com o histórico fica perdido no meio, quando poderia introduzir o
assunto. Mas é inquestionável o quanto o autor pesquisou o tema, entrevistou
médicos, pesquisadores e psicólogos. O livro é repleto de relatos de vida, com
diálogos da jornada de pessoas diferentes no vazio existencial, por que ao
contrário do que é muito dito, a depressão não é tristeza, é um vazio, um
desanimo no vácuo, e não exatamente uma grande tristeza. Ela não nasce
necessariamente de um término de relacionamento ou perda de parente, mas de uma
sucessiva condição de existência no vazio ao longo de anos.
Esse livro é
excelente para profissionais da área de saúde e curiosos do tema. Mas caso você
flerte com a depressão ou a tenha, primeiro tenha certeza que esteja
estabilizado, já que eu que não tenho isso me senti bastante abalada pelos
relatos, já que aqui fica claro que aquele conceito de olhar o abismo, e o
abismo olhar para você é muito palpável! É de fato um tratado que abrange
diversos aspectos e acima de tudo nos faz pensar e questionar sobre o tema. E
deixo aqui o mesmo conselho que Andrew, se você está com estas nuvens sobre sua
cabeça, procure ajuda, a depressão é solitária, mas você não precisa atravessá-la
sozinho!
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