“Seu único crime foi ser uma mulher livre”.
Começar esta resenha com esta frase nos parece bem machista, mas isso
infelizmente era uma verdade na época em que Mata Hari viveu. Mesmo assim, tentou
mudar, ser mais ela mesma, só que pagou um preço muito alto por isso. Ela era
uma pessoa forte e determinada, e foi dito que era uma mulher que nasceu na
época errada, porque os padrões eram bem rígidos, e a figura feminina sempre
tinha que ser submissa, sorrir quando nada ia bem, e, muitas vezes, “aceitar”
as safadezas dos maridos, que mantinham a “certinha” em casa e as outras nos
bordéis, principalmente os ricos que davam joias caras e moradia dentre outras
coisas para suas amantes.
Margaretha Zelle
era o nome verdadeiro de nossa protagonista, que nascera na Holanda, na cidade
de Leeuwarden, local que muitos holandeses nem mesmo sabiam onde era, nem
ouvido falar. Era uma cidade onde nada acontecia de interessante. Margaretha era
considerada uma jovem bonita, que todas as amigas adoravam imitar. E desde nova
pensava que faltava algo mais em sua vida. Quando seus pais perderam a fortuna
em 1889, a mandaram para uma cidade de nome Leiden para frequentar uma escola e
ter uma educação refinada, e, assim, ser professora de jardim. E, claro,
esperar por um marido. Na partida, sua mãe lhe dera uma semente de girassol para
que ela aprendesse a seguir seu destino com alegria.
“As
flores nos ensinam que nada é permanente, nem a beleza, nem o fato de
murcharem, porque darão novas sementes...”
Na escola,
então, começou o seu sofrimento, o qual depois ela tomou coragem para se
rebelar, fazendo planos para sair dali o mais rápido possível e mudar de vida.
Tudo teve início quando ela foi estuprada pelo diretor da escola, e na época só
tinha dezesseis anos, só que não tinha coragem de falar com ninguém, pois tinha
medo de ser expulsa. Então resolveu tentar mudar essa situação para não ser
mais molestada (não só ela, mas outras passaram por essa terrível situação
antes, o que Zelle só soube depois).
Juntando
isso com o tédio do lugar, resolveu ver anúncios de jornais e descobriu que
havia um oficial do exército holandês de descendência escocesa, que procurava
uma jovem para casar e morar no exterior, onde servia na Indonésia. Com isso,
ela mandou uma carta, respondendo o anúncio e eles passaram a se conhecer e por
fim casaram-se.
Só que a
vida dela não estava nem perto de melhorar, pelo contrário, ficou ainda pior. Seu
marido a maltratava, tinha amantes, e, para completar, seu filho foi envenenado
pela babá (que também foi envenenada depois), ficando só com sua filha. Tantas
coisas se passaram com ela, que resolveu abandonar o lar e fugir para a França,
largando tudo, inclusive a filha (sobre quem não tivemos muitas informações
neste livro). Nossa protagonista, então, foi embora com a cara e a coragem numa
época tumultuada pela guerra. Foi aí que seu nome passou a ser Mata Hari. Chegando
lá, passou a se apresentar em teatros e começou uma nova etapa em sua vida.
Sua dança
sensual, proveniente da Indonésia, atraiu homens e a ira das esposas. Teve
muitos amantes graúdos, que a enchiam de joias, presentes e chácaras, e por aí
vai. Foi uma mulher fora dos padrões tradicionais, mas pecou, para mim, pela
ingenuidade.
“Bailaria
exótica, confidente e amante dos homens mais ricos e poderosos do seu tempo,
figura de passado enigmático, despertava ciúme e inveja das damas da
aristocracia parisiense”
Depois de
vivenciar muitas coisas, acabou sendo envolvida numa grande trama e não teve
apoio de nenhum para quem prestou favores na cama. Muito pelo contrário, como
eram homens importantes, seus nomes e reputações não podiam ser tocados. Então
ela pagou um preço muito alto encontrando a morte por fuzilamento como era
comum na sua época. Mas seu nome é lembrado até hoje como uma importante figura
feminina na história mundial, como “símbolo de força e audácia feminina”.
Fazia anos
que eu não lia nada de Paulo Coelho, mas me interessei por esta obra, já que
retrata a história de uma moça que vivia numa outra época, na qual a mulher não
tinha nenhum privilégio, sendo considerada à margem da sociedade e um ser
abaixo dos homens. Enquanto eles faziam tudo o que queriam e tinham todas as
regalias que desejavam, elas eram as submissas.
Porém, Mata
Hari provou que nós, mulheres, podemos ir à luta. E mesmo vivendo numa época
terrível para o sexo feminino, ela foi contra às coisas impostas pela
sociedade, sem medo e com muita coragem, enfrentando o que estivesse em seu
caminho para ser uma mulher livre. Pessoas como ela que fizeram a diferença,
possibilitando-nos de chegar aonde chegamos, mesmo que ainda exista muito
caminho pela frente. É por isso que eu, definitivamente, não poderia deixar de
ler e ter este exemplar na minha estante. E indico para todos também.
Apesar de
ser uma obra curta, com menos de duzentas páginas, acho que Paulo Coelho
conseguiu nos apresentar a história de Mata Hari muito bem, com uma narrativa
interessante e fluida, que mostra os pontos mais importantes de sua vida. Porém,
acredito que poderia ter algumas páginas adicionais para sabermos um pouco mais
sobre alguns detalhes, incluindo sobre a filha dela, como comentei
anteriormente, já que não obtivemos mais informações sobre a mesma. Isso não
faz com que tenhamos menos conteúdo ou que não possamos entender a trama de uma
maneira geral, mas não ficaria incomodada de saber um poucos mais.
Para quem
não sabe, Mata Hari realmente existiu, e o autor se baseou em fatos reais que
descobriu através de pesquisas intensas sobre esta grande mulher. Ele, então,
reconstituiu sua história utilizando, de maneira ficcional, cartas verdadeiras
trocadas entra ela e seu advogado, que cuidava de seu caso quando ela estava na
prisão de Saint-Lazare, em Paris, pouco antes de ser executada.
Gostei muito
de conhecer mais a fundo a vida desta mulher incrível e admirável, que lutou
pela liberdade, que correu atrás de sua verdade e identidade, contra tudo o que
havia de convencional naquela sociedade em que viveu. E ela nunca se deixou
intimidar, mas pagou caro por isso. E devo confessar que me senti triste e
revoltada por seu destino final.
O título do
livro faz sentido por conta de algo muito importante que aconteceu, que,
inclusive a levou à desgraça. Não posso comentar mais sobre isso porque seria
spoiler, mas achei muito interessante, apesar de triste.
A edição,
publicada pelo selo Paralela, da Companhia das Letras, conta com a foto em
cores de Mata Hari na capa e algumas outras em preto e branco no miolo, uma
breve nota do autor no final do exemplar, falando sobre sua pesquisa e
indicando outra leitura sobre ela. A diagramação do texto é bem confortável
para a leitura, com fonte e espaçamentos em tamanhos bons e a edição impressa
conta com páginas amarelas.
Recomendo a
leitura deste exemplar sobre a vida de uma mulher que fez diferença em sua
época e sofreu consequências terríveis só por ser do sexo feminino, para todas
as pessoas que curtem obras sobre mulheres fortes e admiráveis, escrita por um
excelente autor que nos mostrou relatos interessantes. E, mesmo esta não sendo
uma biografia, consegue nos apresentar Mata Hari muito bem.
Avaliação
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