Jane Eyre - Charlotte Brontë


Jane Eyre vive uma vida intensa. Desde pequena, passou por diversos sofrimentos, momentos tristes e repreensões, mas sempre se manteve fiel a seus princípios, sendo firme e independente e tentando dar o máximo de si em tudo o que faz. Sem saber o que é amar e ser amada por ninguém além de si mesma, ela sabe seu valor e vai em busca do que acredita ser o melhor. Porém continua enfrentando tempestades e pessoas desnecessárias.
Quando finalmente entende o que é amar alguém e ser amada de volta, o destino lhe proporciona uma descoberta que acaba mexendo com toda a sua vida e fazendo com que ela tenha que se adaptar ao novo mais uma vez. Sem deixar de lado sua força e perseverança, ela recomeça para enfrentar o que estiver pela frente, amadurecendo a cada etapa e encontrando mais força dentro de si para continuar sua jornada. E, no meio do caminho, Jane se aproxima de mais pessoas, evolui como ser humano, aprende mais e decide ir em busca de seu final feliz.
Eu já conhecia a história de Jane Eyre porque há alguns anos assisti à adaptação cinematográfica homônima estrelada por Mia Wasikowska e Michael Fassbender. Na época, gostei bastante do filme, mas não estava preparada ainda para ler o livro, porque achei que tinha um tom mais melancólico e não era o que eu precisava/apreciava naquele momento numa leitura. Porém, alguns poucos anos se passaram desde então e hoje eu me sinto mais preparada para ler obras com esse teor melancólico e também estou mais acostumada a ler Clássicos, então simplesmente fiquei apaixonada pela leitura, que entrou para uma das minhas favoritas da vida. E é assim que podemos concluir que é sempre melhor encontrar o seu tempo certo de ler determinado livro. O que poderia não funcionar em um momento de sua vida pode se encaixar perfeitamente em outro e te entregar uma experiência maravilhosa.

Se tem algo que eu absolutamente adoro são mulheres fortes, então livros protagonizados por elas me enchem de felicidade e orgulho. E posso afirmar que Jane Eyre, definitivamente é uma das protagonistas femininas mais fortes que já conheci em minha vida de leitora. Foi realmente muito admirável vê-la lutando para ser ela mesma, independentemente do que os outros faziam, falavam ou como gostariam que ela agisse. E se tivesse que enfrentar o que fosse para continuar com seus princípios e seu caráter, fazia sem nem pensar duas vezes.
Talvez por conta de sua idade (ela tinha apenas 18 anos) e vivência até aquele momento, já que não conhecia muito do mundo ou das pessoas, afinal viveu numa casa ruim com gente desagradável e nociva por toda a sua infância, depois viveu quase trancada num local convivendo apenas com mulheres (salvo uma ou outra visita de homens ao local, mas com quem não tinha muito contato direto), Jane Eyre é bastante ingênua e também submissa em determinados momentos. É claro que o leitor que conhece sua personalidade forte, determinada e sincera espera que ela só entregue comportamentos condizentes e mais rebeldes, sem abaixar a cabeça para qualquer situação. Mas eu entendi a personagem, ainda que tenha querido que ela fosse menos submissa algumas vezes.
Porém, é bem difícil sermos exatamente quem queremos ser hoje em dia (isso vale para ambos os sexos, apesar de ainda ser mais difícil para as mulheres) e isso porque vivemos num século mais avançado e mais liberal do que o que ela viveu, então consegui enxergá-la como quem realmente era: uma garota bem jovem, que ainda não conhecia muito da vida, que não tinha dinheiro, família, pessoas queridas por perto, amigos, que não tinha para onde ir, nem muito o que fazer de sua vida, já que a sociedade restringia muito as mulheres e suas “permissões”, e pela primeira vez em sua existência estava se sentindo bem. E ainda é dona de uma personalidade bondosa que só quer fazer o bem ao próximo e sempre ajudar no que puder.

Ela curtia aquele novo ambiente, gostava das pessoas que estavam por perto, de seu trabalho e de Adèle, de ter um teto para morar, comida para comer, fogo para se esquentar, indivíduos com quem pudesse conversar e também alguém que fazia seu coração ficar mais quente. E isso se repetiu novamente depois, quando ela foi para outro lar e gostava muito da convivência com aquelas pessoas, com quem logo construiu amizades genuínas. E Jane não queria estragar essas coisas, então acabava abaixando a cabeça em determinados momentos, mas sem nunca perder sua essência, seu discurso afiado ou sua personalidade adorável, sincera e autêntica, falando o que pensava, sem se importar com as consequências, desde criança. E foi por isso que amei a personagem.
Devo dizer que Sr. Rochester é um personagem de quem gosto bastante, ainda que não aprove ou concorde com todas as suas atitudes. Pelo contrário, inclusive detestei algumas de suas falas e modo como tratava Jane. No entanto, olhando pelo ponto de vista dele e não do de Jane (ou de uma mulher ou de alguém do século XXI), pude entender que como um homem daquela época, como foi criado e como via outras pessoas, além do que era esperado dele, parecia que Rochester simplesmente não entendia e/ou não gostaria de aceitar seus sentimentos por Jane Eyre, provavelmente por conta de sua própria condição de um homem de posses, rico e respeitável, mas, mais do que isso, porque ele era bem mais velho e também por tudo o que passou em sua vida. E pareceu que ele achava difícil de acreditar que ela pudesse nutrir por ele uma reciprocidade de sentimentos, já que não o achava bonito e era muito mais nova.


Então, pelo seu ponto de vista, ele apenas queria testá-la para descobrir a verdade já que não podia fazer isso perguntando diretamente. E graças a essa nova descoberta, ele acabou amadurecendo como pessoa e mudando algumas coisas em sua forma de pensar e também de agir, fazendo com que, no desenrolar de tudo isso, tenha se tornado alguém melhor. O que eu acho interessante nessa situação é que ele quis mudar e conseguiu, e todos sabemos que essas coisas são difíceis de acontecer, principalmente com homens de séculos anteriores, que tinham visões bem claras e fechadas em suas mentes e dificilmente evoluíam. Claro que na prática ele infelizmente pareceu grosso e fez comentários desnecessários durante o caminho, mas acredito que isso tenha apenas soado realista para a época e contexto histórico. Sem dúvidas tudo isso que comentei acima são apenas minhas opiniões pessoais, podem nem ser o que a autora tentou transmitir.
Não fui muito fã de uma coincidência que aconteceu na obra, quando já estamos nos aproximando do final da leitura. Acho que ficou um pouco forçado, mas entendo que essa foi a forma que Charlotte encontrou para entregar uma felicidade mais genuína a Jane. Eu teria mudado apenas um detalhe, mas entendo que ela tenha feito exatamente da forma que fez.
A escrita de Charlotte flui, surpreendentemente, de forma maravilhosa. Mal começamos a ler seu exemplar e, quando notamos, muitas folhas já foram deixadas para trás. Algumas pessoas têm receio de ler por conta da quantidade de páginas (são mais de quinhentas) e por se tratar de uma trama de quase dois séculos atrás, mas digo para mergulharem sem medo, já que a narrativa é bem desenvolvida, muito gostosa, e traz um misto de sentimentos e sensações no leitor, que ora fica feliz, ora triste, em alguns momentos revoltados e em outros orgulhosos, etc.

Além do mais, dá muito orgulho de ver que uma mulher que viveu naquele período já pensasse tantas coisas revolucionárias para a época, que buscasse a igualdade entre sexos e quisesse/lutasse para que o papel da mulher fosse mais do que apenas o de coadjuvante na vida dos homens. Sem medo, Brontë apresenta pensamentos inquietantes para o contexto histórico em que vivia e nos brinda com uma protagonista admirável, inteligente, íntegra e afiada. Além disso, as críticas sociais nos fazem entender mais a Inglaterra daqueles anos e como as pessoas precisavam de coisas diferentes.
Apenas dois pontos me incomodaram muito na leitura inteira. O primeiro foi a participação estendida de St. John. Que personagem chato! E pior é que ele ficou presente por bastante tempo e eu não aguentava mais vê-lo abrir a boca e soltar aqueles comentários ridículos tentando impor seus próprios desejos e o que achava ser o correto em Jane. E isso também não soou muito humano, empático ou religioso da parte dele e nem parecia com tudo o que ele fazia e como agia com as outras pessoas. Eu realmente fiquei com vontade de entrar no livro e tirá-la de perto dele e levá-la para beeeem longe o quanto antes. A pior coisa é que, com tanta insistência em um assunto específico, ele quase, quase mesmo, fez nossa querida Eyre mudar quem era e se transformar completamente, fazendo com que sua essência se perdesse para todo o sempre, o que seria uma pena, já que a personagem é maravilhosa e uma das melhores que eu já tive o prazer de conhecer. Mas que alívio senti já que tudo isso ficou apenas no quase e pudemos continuar vendo-a ser ela mesma!
O segundo é que achei alguns comentários ou situações preconceituosas ou etnocêntricas, talvez por conta de uma visão da própria Charlotte Brontë. Em uma delas Jane Eyre fala de forma esquisita sobre Adéle ser francesa, em outra sobre as crianças da escola em que ela ensinou, já que as considera superiores a outras simplesmente por serem britânicas. E, também, a mulher louca da trama e também uma nada confiável eram estrangeiras.

Sempre gosto bastante das Notas de Rodapé encontradas nas obras da Coleção Clássicos Zahar e dessa vez não foi diferente. Elas estão ali para nos situar em momentos, situações, pessoas, fatos, etc. E sempre ajudam o leitor a entender passagens que não necessariamente estavam claras, além de nos situar no momento histórico. Algo que achei inusitado (não porque não entendo ou é estranho, apenas por não estar esperando isso especificamente nessa obra) é que as desse livro têm um cunho mais religioso e muitas delas (acredito que a maioria) são referências a passagens da Bíblia ou relacionadas a esse contexto.
Na incrível Apresentação, Antonia Pellegrino fez alguns comentários breves sobre as adaptações da obra e afirmou que a série da BBC de 2006, com Ruth Wilson e Toby Stephens, é a melhor e mais fiel. Depois fui em busca de outros comentários sobre o assunto e percebi que realmente muitas pessoas preferem essa adaptação, então já estou em busca dos episódios e pretendo assistir em breve. Depois posso voltar para comentar sobre a experiência.
Quando comecei a minha leitura de “Jane Eyre”, já estava com boas expectativas e acreditava que iria gostar bastante do resultado final. Charlotte Brontë conseguiu superar tudo o que eu esperava e transformou minha experiência em algo ainda melhor, mais envolvente e com um enredo trabalhado de forma excepcional.

Fico realmente muito feliz de ter tido a oportunidade de ler essa deliciosa obra, escrita no Século XIX, que com certeza só trouxe acréscimos à sociedade mundial por sua existência. Recheado de reviravoltas surpreendentes e com críticas sociais para fazer o leitor refletir, principalmente sobre o papel da mulher (incluindo a igualdade dos sexos), conhecemos uma protagonista incrível, forte e autêntica, que é fiel a seus princípios e transmite coisas boas ao próximo. Esse livro acabou se transformando num dos meus favoritos da vida e espero que muitas outras pessoas tenham a oportunidade de lê-lo e se apaixonarem tanto quanto eu.
Avaliação



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