A Sombra do Vento - Cemitério dos Livros Esquecidos #01- Carlos Ruiz Zafón

Conheci Zafón através do livro Marina, e demorei muitos anos para finalmente ler A Sombra do Vento, primeiro volume da série Cemitério dos Livros Esquecidos, publicado pela Suma de Letras. Ele estava na estante me encarando todo esse tempo, e chegou o momento de ler o livro que fez o autor ser conhecido e reverenciado!

Após uma madrugada inusitada com uma visita inesperada Daniel Sempere tem em suas mãos um livro raro, A Sombra do Vento. Algumas horas depois o livro está lido, e o garoto tem apenas um objetivo: saber quem é o autor e onde encontrar seus demais livros. Uma busca que começa inocente, e atravessa o tempo se transforma em uma perigosa estória que coloca em risco que é mais importante para ele, ao mesmo tempo em que verdades guardadas a sete chaves vem a tona.

Zafón tem uma narrativa em primeira pessoa muito peculiar e única dele, ao mesmo tempo que soa simples e direta, evoca em suas ações críticas, especialmente políticas dentro da Espanha. Suas peculiaridades trazem uma atmosfera que beira sempre a fantasia, sem de fato se adentrar nela, com um toque gótico sutil. Você se imagina nas ruas de Barcelona na chuva perdido junto a Daniel tentando compreender quem é Julian Carax, esse autor que escreveu livros que foram queimados e não deixou rastro de sua existência, e mais do que no lugar de Daniel o autor desperta a curiosidade de saber o que aconteceu com Carax e seus livros.

A estória é desenvolvida em uma linha do tempo linear do ponto de vista de Daniel, mas não linear quando os diversos personagens contam suas vivências com Julian. É através desses relatos e descobertas que Sempere costura a estória de vida de Julian e termina na descoberta de sua verdadeira vida, e devo dizer é triste e é surpreendente!

Embora agradável o livro não permite um ritmo muito rápido de leitura, e isso porque o autor as vezes exagera um pouco em certos pontos da estória, e algumas páginas ao meu ver poderiam ter sido tiradas, já que não acrescentam muito a trama. Este ritmo ora lento, ora fluído pode desestimular a leitura para algumas pessoas acostumadas a narrativas mais acessíveis.

Daniel é um jovem determinado a descobrir a estória de Carax, mesmo que isso coloque em risco sua vida ou a de seu pai, com isso ele pode ter ações exageradas e destemidas. No fundo tudo é inocência, ele não consegue perceber a maldade das pessoas, e sempre tende a acreditar nelas. Ao mesmo tempo tem uma grande identificação com o autor.

O pai de Daniel é muito dedicado ao filho, e respeita o espaço do mesmo sem sufocá-lo, é uma relação bonita de acompanhar. Fermín Romero de Torres é um homem que Sempere tira das ruas para trabalhar com ele e o pai em sua livraria, dono de uma personalidade marcante, este homem se torna melhor amigo de Daniel, e embora carregue uma estória de vida muito triste é fonte de humor e leveza a narrativa.

Julian Carax é um jovem perturbado que é levado a caminhos estranhos na vida, sem se dar conta de quem está por de trás deles. Seus amigos de escola, Míquel Moliner companheiro até o fim de seus dias, e Jorge Aldaya não aparecem por muito tempo na narrativa, mas têm papéis fundamentais no andamento da trama.

Os demais personagens que surgem são muito variados e interessantes, Clara uma jovem cega e seu tio livreiro e boêmio, Fumero um policial sem qualquer ética e moral, Nuria uma mulher de caráter duvidoso, Beatriz a jovem que desperta o amor em Daniel, além dos vizinhos como o catedrático dramático e o relojoeiro que gosta de se vestir de mulher. Todos bem caracterizados e bem encaixados nessa estória repleta de detalhes e enigmas.
Zafón encheu o livro com referências históricas da Espanha, por falta de conhecimento a respeito não sei dizer quanto foi fiel e imparcial, mas a crítica ao governo da época é muito marcante e direta. Os personagens em todo tempo evocam o tema sem uso de metáforas ou eufemismo.

A Sombra do Vento é antes de mais nada uma estória de vida de alguém que amava os livros e escrevê-los, mas teve a vida atropelada pelos acontecimentos mais inesperados. Ao mesmo tempo que é um passeio pelas ruas espanholas é um retrato de amor aos livros e tudo que eles geram além da leitura. Um livro pode ser apenas um bom entretenimento, mas pode também gerar mudanças e buscas que nunca sabemos onde irão dar. A Sombra do Vento é o exemplo do que uma busca pode resultar. Prepare-se para se surpreender porque nestas páginas nada é óbvio, e qualquer coisa pode surgir das sombras deixados pelo vento!

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