Antes da Tempestade - Dinah Jefferies

É incrível as possibilidades de viagem que um livro nos trás, só no dia de hoje eu estive na Índia do começo do século XX, e de lá fui direto para a Alemanha na segunda guerra mundial. Quando o livro é bom então essa imersão é mais forte ainda, com Antes da Tempestade meus dias na Índia foram bastante intensos, escrito pela autora Dinah Jefferies, e publicado pelo selo Paralela, eu cheguei a sentir o calor desta terra!
Eliza é uma viúva inglesa que tem como paixão a fotografia, ela recebe uma proposta de trabalho que vai permitir que una sua paixão e ao mesmo tempo tente se reconstruir. Hospedada no castelo da família real indiana, Eliza precisa fotografar a vida destas pessoas. Mas o que ela não sabia é que entre costumes e tradições ela se viu em meio a conspirações e traições, ao mesmo tempo em que conhece o príncipe Jayant que começa a despertar nela coisas que ela sequer sabia que existia. Diante da pobreza e das guerras políticas esta jovem deve encontrar seu lugar no mundo.
Jefferies mais uma vez no brinda com uma narrativa em terceira pessoa com forte carga emocional. Trabalhando com temas fortes como luto, perda, pobreza, classes sociais (no caso da Índia castas), lugar da mulher na sociedade, ela consegue através de sua estória transmitir com muito realismo como era a vida nesta época tanto para os próprios indianos que eram ainda colônia da Inglaterra, quanto para os ingleses que trabalhavam para manter o domínio.
Esta época ainda é marcada por muito preconceito, tanto dos indianos que queriam sua terra para si e não confiavam nos ingleses que não entendiam e menos ainda aceitavam seus costumes, quanto o contrário, dos ingleses que queriam manter seus negócios controlados na colônia. Embora a modernidade estivesse chegando aos poucos, e a Inglaterra também já estivesse com a intenção de abrir mão da colônia a tensão é contínua, e as conspirações de ambos os lados existem.
Elisa se vê no meio desta 'guerra fria' quando esperava apenas poder fazer suas fotos. O que ela não imaginava é que sofreria por quem é, primeiro uma inglesa, segunda uma viúva (na Índia a viúva é mau vista porque a perda do marido recaí sobre ela, é como se ela não tivesse cuidado do mesmo da forma correta, e por isso ele tenha falecido), e por fim o fato de ela ser uma mulher que exerce uma profissão não comum entre as mulheres na época.
Jay é um homem que estudou na Inglaterra, mas vive dividido entre o mundo que nasceu e o mundo que quer construir sem tantas regras . Ele quer seguir certas tradições, mas outras ele já quer transgredir por achá-las desnecessária, isso faz com que sua família não a veja com bons olhos. Desde o primeiro momento ele trata Eliza com respeito e carinho.

Diversos personagens secundários circulam especialmente pelo castelo, Indi, por exemplo, faz pinturas no castelo, e tem muito ciúmes de Eliza. Dev, amigo de Jay é um homem de índole duvidosa. Já Chatur é o funcionário mais próximo do marajá e faz de tudo para atrapalhar a vida da fotógrafa. Clifford é o representante do governo inglês que contratou Eliza, mas devo dizer que ele é uma pessoa muito egoísta e sem a menor empatia. Dottie é a única que de fato ofereceu amizade verdadeira a moça, mas tem pouca participação na trama.

Os cenários da trama são bem diferenciados, desde o castelo com sua riqueza até vilarejos muito pobres onde a água é escassa. Com riqueza em suas descrições a autora nos permite imaginar como cada um destes lugares são. O que senti falta foi um pouco da religião hindu, que embora seja citado que eles rezem, e até festivais e costumes advindos desta, ela não cita deuses ou maiores detalhes dos mesmos, seria um acréscimo bom como pano de fundo.

Embora a estória tenha o romance eu diria que o foco do livro não seja apenas ele. A autora parece querer ir além e contar como era a vida nesta época, ao mesmo tempo que amarra à história de vida de Eliza. Todos o fatos do passado da moça se ligam ao seu presente, tudo têm seu porque, e é bem explicado.

Para quem leu O Perfume da Folha de Chá, Dinah neste volume nos poupou um pouco de sofrimento, em Antes da Tempestade existe dor, mas é mais branda. Antes de querer falar de uma mulher, a autora quer contar a estória de uma nação que viveu como nosso país, como uma colônia submissa as ordens de alguém, um estranho conhecido. Uma estória de amor, de transformação e sem dúvida muitas cores e aromas!

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