O Homem Invisível - H. G. Wells


Os habitantes da pequena cidade pacata de Iping não imaginavam que seus dias estavam prestes a ser bem agitados e até mesmo aterrorizantes. Isso porque eles não sabiam que um certo cientista, que havia se hospedado na pensão local, Coach and Horses, iria se revelar nada mais, nada menos do que um homem invisível.
Mas, voltando no começo, esse homem bem misterioso, vestido com um casaco grande, chapéu, óculos escuros e bandagens cobrindo o rosto chegou no local com intuito de continuar com suas pesquisas, que o fariam ganhar muita fama e notoriedade rapidamente, afinal ele tinha uma descoberta brilhante para relevar ao mundo.
Mesmo com seu temperamento difícil e arrogância desmedida, algumas pessoas se interessaram em ajudá-lo e lhe trataram tão bem quanto podiam. Porém, quanto mais tempo vai passando sem que ele se revele direito – ninguém nunca tem a possibilidade de ver seu rosto ou sua pele –, mais a curiosidade da população local aflora, fazendo com que muitos comecem a se questionar quem é aquele homem, o que ele pretende e se o que está fazendo pode acarretar algo de negativo ou ruim para alguém. Seria ele uma vítima de um acidente que lhe deixou desfigurado, um fugitivo da polícia ou algo mais sombrio?
As coisas vão começando a sair do controle, alguns acontecimentos inesperados surgem e até mesmo crimes, e há a descoberta de que aquele homem nada mais é do que invisível. Mas como isso é possível?! Ameaças e ações vão surgindo e agora o medo começa a ser propagado na hospedaria e nas redondezas. Afinal, se você não pode enxergar o inimigo, quantas possibilidades ele tem de fazer tudo o que quiser contigo?
Já fazia um tempo que eu estava curiosa para ler alguma das obras de H. G. Wells, que é um autor renomado de ficção científica clássica. Então, quando surgiu a oportunidade de ler “O Homem Invisível”, me agarrei a ela e comecei rapidamente a leitura.
Algo que acho válido comentar nesta resenha é que a obra é bem diferente de como eu imaginei que seria, e isso a fez ser bem intrigante e até mesmo mais fascinante. Assim como a população local de Iping, o leitor não tem muitas informações acerca deste curioso novo hóspede, que escolheu uma cidade sem muita coisa acontecendo para terminar suas tão importantes pesquisas. Mas, por que motivo ele escolheu esse lugar?
Conforme as páginas vão sendo avançadas, temos a possibilidade de entendê-lo melhor e também as suas motivações. Afinal de contas, ele conseguiu se transformar num homem invisível e esta é uma grandiosíssima descoberta, que vai mudar a vida do ser humano como conhecemos, já que existem inúmeras possibilidades de uso de tal invenção para o mundo – para o bem e para o mal. E isso faz com que ele comece a desejar, ou até mesmo ansiar fortemente por poder e fama. E tem certeza de que vai conseguir tudo isso e muita notoriedade.

Um dos pontos mais interessantes nessa trama é o fato de o autor focar no comportamento humano de uma maneira bem real e reflexiva, tanto que acaba ganhando até mais destaque do que a parte de ficção científica da mesma, fazendo com que não haja explicações mais aprofundadas sobre os assuntos ou métodos abordados na leitura, assim como termos científicos ou mais difíceis, permitindo que fique mais fácil de o leitor entender cada nuance do enredo, mesmo que não se interesse por esse assunto ou não tenha conhecimento grande da área.
Ou seja, como destaque há uma grande crítica social, do comportamento do indivíduo como um todo e também como um ser único, sozinho contra todos os outros. Nos mostra também como a solidão pode ser difícil ou prejudicial em determinados casos e em como um ser humano pode se transformar em algo mais próximo de um monstro quando é privado de determinadas coisas, com a possibilidade de perder, inclusive, sua humanidade. E também como o pensamento de diversas pessoas unidas como um todo pode ser prejudicial para o indivíduo solitário. Entre diversos outros pequenos pontos reflexivos, que cada leitor pode encontrar na sua própria experiência de leitura. Achei extremamente interessante que o autor tenha escolhido explorar todos esses lados.


Devo confessar que achei a trama até certo momento meio morna, sem grandes acontecimentos ou algo que realmente me fizesse ficar ansiosa para avançar para as próximas páginas. Mas pelo menos ele mudou isso do meio para o final, quando diversas situações iam ocorrendo e a gente acaba ficando ansioso para descobrir o desfecho o quanto antes. Porém, tudo acontece muito rápido neste período, o que faz com que nem todas ganhem uma profundidade esperada.
Sobre os personagens de maneira geral, senti falta de um aprofundamento melhor de qualquer um deles para pelo menos conseguir me aproximar ou conhecer alguém bem, mas Wells optou por deixar todos superficiais, com apenas uma ou outra característica aparecendo ou alguma informação relevante sendo mostrada.
Acredito que dificilmente alguém vai sentir muita empatia ou se apagar ao protagonista, visto suas atitudes, ideias e pensamentos, seu comportamento hostil, inconsequente, grosso e individualista de uma maneira ruim, sua ganância de chegar a seus objetivos, fazendo o que tiver que fazer contra quem aparecer pelo caminho, sem pensar nas consequências, que de fato não devem existir para ele, que, em sua concepção, detém o poder. E, como não conhecemos muito ninguém além dele, também não vamos nos sentir próximos de nenhum dos personagens secundários que acabamos por conhecer no meio de sua jornada.
E acho que, acima de tudo, essa é uma trama muito reflexiva. Tanto com relação aos pontos citados anteriormente quanto com o mote central da obra. Afinal, quem nunca desejou poder ter o dom da invisibilidade? Mas quem realmente pensou no lado negativo disso? Com certeza eu não sou a única que só havia pensado nas coisas positivas que poderia fazer se fosse invisível, mas depois dessa leitura percebi que o lado negativo é gigante também e até mesmo supera as coisas boas.
Ainda que eu não tenha lido tantos clássicos quanto gostaria – o que estou conseguindo modificar de alguns anos para cá –, achei a linguagem de H. G. Wells bem fácil, ágil, interessante e até mesmo possui traços de humor em alguns momentos. O que me fez assimilar sua forma de escrita a outros autores clássicos que li. Não sei se por conta da tradução, já que li essas publicadas pela mesma editora, Zahar, ou simplesmente porque o autor possui essas características em sua forma de escrever.
A edição que li foi a Comentada, que é do tamanho padrão dos demais títulos comentados da Coleção Clássicos Zahar, com 16cm x 23cm, possui capa dura ilustrada e maravilhosa feita por Rafael Nobre da Babilonia Cultura Editorial, casando muito bem com o protagonista e com o enredo, folha de guarda ilustrada com o tema do livro e páginas amarelas.
E, o mais interessante nesta edição é que ela possui uma ótima apresentação de Thiago Lins e tradução e notas de Alexandre Barbosa de Souza e Rodrigo Lacerda. Esses textos e comentários nos situam na época, local, situação, etc. e nos auxiliam em momentos de suma importância da leitura. Além de trazer cronologia da vida e obra de Wells, que eu sempre gosto de conferir.
Mesmo que você não seja um grande leitor de ficção científica ou clássicos, indico muito a leitura de “O Homem Invisível”, que ultrapassa a barreira do tempo e de ser definido apenas como um gênero literário, indo muito além disso tudo. Ainda nos mostra como o comportamento humano pode ser imprevisível e que um todo ou a busca pelo poder e o aumento de ganância pode afetar diretamente um indivíduo solitário de maneira irreversível. E, além de tudo isso, tem a maravilhosa capacidade de nos fazer pensar. Para finalizar, deixo aqui um pequeno questionamento: e você, gostaria de experimentar o poder da invisibilidade?
Avaliação



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